Entre o regaço das pernas, já lá está, abeirado, por baixo da manta encarnada, a contorcer-se à melhor posição que o corpo lhe permite.
É calor, proteção, é amor que dá a qualquer um que se amanhe e lhe permita ser cão. Como gostaria, por vezes, de ser este cão, saber o início e o fim do mundo, como se não houvesse mais nada. Que na realidade não há! E esquecer na consciência, em passagens de quartos de hora, de gente claro!, tudo o que não faz falta.
Entretanto adormeci e acordei, comi um pedaço de pão duro do dia anterior e ainda estava bom. Como estava sol resolvi que devia aproveitar o dia, fui então novamente para debaixo da manta encarnada pensar como o poderia fazer, claro que o cão veio novamente, mas desta vez apenas se contorceu por cima da manta. Cão burro, não sabe ele que eu também o sou e que provavelmente vou ali ficar a olhar o sol o dia todo, a pensar no que fazer, até já não haver sol e me começar a lamuriar, até vir outro eu?
Só por ter sido burro vai ter de se levantar, vou mesmo regalar a pele e fazer um manguito ao outro. Logo ele chegará na mesma, o cão lá estará também, é um vendido, ama todos. Mas qualquer que seja a lamuria não será esta, que se faça à vida, ou que me deixe em paz e venha só amanhã.
O eu de ontem.